Lá em casa, minha amiga (Deixe que lhe diga) Ele abre a boca, eu dá-me o sono Só gostava que nos visse Aquilo é uma molenguice Aquilo anda muito morno Eu bem tento pôr ao lume Mas depois, como é costume Vai-se o fogo e vai-se o gaz Volta-se ao mesmo marasmo Eu bem ponho lingerie, oh oui Dou-me ares de Mata-Hari, vê-de Faço pratos e petiscos Noz-moscada, corro riscos Faço riscos na parede A prisão é na cozinha E a capela no chuveiro E na cama há um canteiro Onde as flores não têm luz nem cor Se eu lhe contar um segredo (A medo...) Fico mais desabafada No outro dia ouvi a chave A rodar lá pelas nove E fingi-me desmaiada Vê-me p'ra ali estendida, e vem Dar-me uma reles beijoca Se isso é que é o boca-a-boca Não vou querer que mais ninguém me salve É certo que me distraio, saio Como p'ra longe do mundo Subo à torre, toco o sino E num belo submarino Vou até bater no fundo Depois venho respirar, o ar Que me coube nesta vida Volto ao ponto de partida São quase horas de ele querer jantar Ai, amiga, se eu chegasse (ah, se...) Ao momento da verdade Dizia-lhe assim à bruta: "Mata-ratos e cicuta Tomarás em quantidade" A hora do telejornal Era o momento ideal Tanta guerra e tanta fome E o meu crimezinho incólume Deixava-o morto e sentado, de lado Com as mãos ainda ocupadas Numa o controlo remoto E na outra o totoloto Em ambos as unhas cravadas Ia comprar espumante, ante A surpresa do merceeiro Que malicioso e matreiro Perguntaria: "a quem vai brindar?"